Natan Cavalcante e Samara Monteiro, 18 e 19 anos, estudantes de Jornalismo e Direito, respectivamente. Concordamos, discordamos, questionamos e expomos nosso ponto de vista como juventude pensante e participativa na sociedade. Aqui é sempre fim de tarde, num parque onde todos os bancos são nossos.

sábado, 27 de novembro de 2010

Saltitantes

Há dias em que a inspiração brota da minha mente, e as palavras escoam no papel sem sequer pedir-me permissão, quase como uma mensagem psicografada. Há outros nos quais nem adianta insistir, ainda que espremam meu cérebro, minhas mãos não responderão. Na correria pelas palavras que tão apressadamente se atropelam, tento organizá-las de maneira coerente, o que as vezes é impossível: como se tivessem vida própria, não me obedecem. Correm sozinhas pelo papel, como uma criança mimada; e se não faço seus gostos, escondem-se, birrentas, e as vezes nunca mais consigo achá-las.
Tinha sido um dia cheio. Eu passara dia no fórum, um caso polêmico, opiniões diversas e depoimentos tão chocantes que por um momento confesso que quis abandonar todas as formalidades jurídicas: nenhuma pena seria justa para um crime como aquele. Aquele dia me fez refletir sobre tantos dos princípios do Direito, ratificando, duvidando, buscando uma solução que parecia fugir a cada nova ideia. De repente ouvi gritos de mulheres, ainda na porta do fórum criminal, entre elas uma tão pequena, chorando muito. "Criança também, chora por tudo!", pensei eu. Mas depois entendi do que se tratava: estavam a espera do camburão, que levaria dois homens de volta à penitenciária. Um dos homens parou, algemado, em frente à garota, que hesitou em chegar perto dele, temendo a reação dos policiais que o acompanhavam. Com a permissão da mãe, correu e abraçou seu pai, chorando ainda mais. E ele nem sequer podia abraçá-la. Meu Deus, que enxurrada de sentimentos desabaram sobre mim, e o quão miserável me sentir por saber que fazia parte da tristeza daquela criança. Vendo-a se afastar, me perguntava que meios a Justiça utilizaria para para fazê-la entender que o Direito estava ali para protegê-la. É claro que a coerção é necessária ao sistema, seu pai cometera um crime e precisa ser punido, mas como fazer com que alguém tão pequeno compreenda algo tão contraditório, do ponto de vista individual? Neste dia me senti profundamente hipócrita, por achar que no lugar dela, odiaria tudo o que eu hoje represento. O camburão seguiu em frente, a menina andou e não pude mais escutá-la chorar, e as minhas lágrimas o vento secou. Só espero que não seque meu coração.

terça-feira, 9 de novembro de 2010

Anistia ou anarquia?

Censura 16 anos, era classificação do último filme que vi no cinema. Longas filas, salas lotadas, mas fui assim mesmo. Não demorou para os primeiros problemas aparecerem...

Logo na entrada, dois meninos tentavam furar a imensa fila, e, sob protestos dos que esperavam nela tão (im)pacientemente nela, o funcionário do cinema os deixou passar. Para alguns pode parecer banal, mas para mim esse é um ato de extrema cara de pau e falta de respeito. Já dentro da sala, a confusão chegou ao ápice: bagunça generalizada, gritaria, gente ouvindo música no celular – e forçando-nos a ouvir junto – tudo isso antes de começar o filme. Até que veio uma funcionária do cinema, comunicar que era necessária a saída de alguns elementos da sala, devido ao tumulto provocado. Pronto, estava armado o circo.
A senhora deu-lhes uma lição de moral e boas maneiras, advertindo-os que caso se recusassem a sair, voltaria acompanhada dos seguranças do shopping, que os retiraria à força. Os adolescentes – ou seriam crianças? – pediram uma segunda chance para comportar-se melhor, sob a justificativa de uma garota que dizia que “não sabia que já deveriam estar quietos, pois o filme ainda não começara... os funcionários do cinema deveriam ter avisado que eles não podiam fazer aquilo, ou seriam convidados a se retirar.” Pois é, o mesmo argumento que seria utilizado pelo meu irmão de 4 anos. Um senhor que estava ao meu lado gritava: “Anistia a galera aí!”, e recebia a reprovação da “galera”, que provavelmente não sabia o que era anistiar. Anistia concedida, a funcionária retirou-se, sendo ovacionada – mas que ironia! – ao som de urros e aplausos dos demais presentes.
Não satisfeito, um outro grupo também queria aparecer. Infernizaram uma senhora até que um homem levantou-se aos gritos, ameaçando ele mesmo retirá-los da sala, e alegando que tinha poder para isto, pois era policial.

O silêncio reinou na sala – mas que quimera! Alguns instantes depois, a tela escureceu e acenderam-se as luzes. Foi bom enquanto durou.

As pessoas saíram da sala impressionadas com o filme, mas muito poucas com suas próprias atitudes. Sim, a corrupção – não apenas do erário, mas dos valores, principalmente – que nos é mostrada no filme é chocante e inescrupulosa. Mas eu costumo sempre dizer que os governos são como um reflexo aumentado dos seus governados. Enquanto o povo não crescer mentalmente, não há governo que provenha o progresso. Até quando, meu Brasil?

Apesar de tudo, gostei do filme, e espero brevemente expor aqui minhas concepções a respeito. É um dos poucos filmes nacionais que eu não tenho a impressão de estar vendo uma novela da Globo. Infelizmente, a novela brasileira eu continuo a presenciar, todos os dias.